Qual o futuro das nossas áreas naturais?
Qual o futuro das nossas referências,
da nossa identidade?
Qual o futuro das nossas memórias?
O Fogo é uma arma afiada.
Orientações aos visitantes
O breu da noite preenchia aquele infinito espaço que era a lagoa e a mata tropical densa que a rodeava. Na realidade, aquilo era um quase breu, já que o céu estrelado se duplicava no espelho d’água escuro da Lagoa Nova, mesclando o brilho das estrelas acima com o das escamas dos peixes abaixo. O silêncio era também um quase silêncio, uma vez que compartilhava seu espaço com o som dos animais que dormiam e dos que não. O cheiro húmico e a neblina branca evaporavam da lâmina d’água e expandiam crescentemente no quase breu. Junto com a noite, o barco fluia cheiro e neblina adentro. Paramos ali na água a esperar o instante transcendental que estaria por acontecer. Ficamos ali, quietos, respirando em comunhão com os que dormiam e os que não. Em um certo momento, vimos formar no infinito uma silhueta de montanha. E outra. E a alquimia do sol transmutou o quase breu em azul e, logo, em vermelho. A neblina absorveu o rubor celeste para si e seguiu expandindo-o por toda a Lagoa Nova. A água que evaporava e seus lírios flutuantes se viram transformados em um misterioso, etéreo carmim. Tudo isso se passou em uma diminuta fração de tempo e no quase silêncio. E não houve aplausos.
Enquanto o barco retornava à base, nós, que acabáramos de testemunhar o sublime, dialogamos em pensamento:
– “Esse espetáculo acontece diariamente na alvorada da Lagoa Nova.”
– “E quase ninguém o vê…”
Terminado o trabalho de campo e revelados os rolos de filme, eu seguiria para a próxima etapa: que era queimar as tais películas – as películas que eu própria havia fotografado. Apesar de já ter planejado bem esta etapa (que incluía experimentar com o fogo de diversas maneiras em películas teste e mapear visualmente o processo específico de queima que eu executaria em cada um dos fotogramas), fiquei postergando este momento da queima como quem procrastina um crime que vai cometer. Eu tentava adiar a dor. A dor da agressão, a dor da irreversibilidade. A dor da impossibilidade de revisitar aquela paisagem naquela visão única do seu existir. A dor de violentar aqueles lugares de tamanha beleza e ensinamentos para mim. A dor de destruir algo que é tão zelado pelo fotógrafo analógico: seu original fílmico. Depois da queima, restaria algo amputado e de uma maneira que eu ainda nem conseguia saber, já que o fogo é arma potente, arma que não se consegue controlar por completo. Além disso, todo o esforço para encontrar e chegar naquele exato local, conseguir a luz desejada e o posicionamento adequado da câmera seria consumido pelo estalido da chama em contato com o químico e a gelatina fotográfica. E assim eu segui postergando o ato, dia após dia. Seria eu duramente criticada por queimar peças originais? Eu lembrei do incêndio da Cinemateca, do Museum Nacional, das queimadas do Pantanal, do Cerrado e da Amazônia, das vilas queimadas durante as inúmeras guerras da nossa História, dos livros queimados pelo regime nazista, eu lembrei de todos esses atos que, tendo acontecido no passado, e eu vivendo no presente, me haviam negado a possibilidade de conhecer coisas valiosas e que são parte da minha própria história. Eu lembrei que este meu trabalho propunha emular estes atos violentos, utilizando-se do mesmo elemento para isso, e assim, relembrá-los simbolicamente, já que violações que não são relembradas pela sociedade tendem a não ser combatidas e, consequentemente, repetir-se no futuro. Ao final, o crime que eu propus que eu mesma executara aconteceu: com a respiração suspensa, acendi o fósforo e aproximei o fotograma da chama. A paisagem ardeu e se deformou. Recordei esses incêndios passados. Mais uma vez me indignei. Doeu.
No dia 27 de agosto de 2019, li na BBC News Brasil: [abre aspas] “O dia 10 de agosto poderá ser classificado como um momento-chave na história recente da Amazônia. Hoje, ele já é conhecido como o ‘Dia do Fogo’, quando produtores rurais da região Norte do país teriam iniciado um movimento conjunto para incendiar áreas da maior floresta tropical do mundo. Essa suspeita está sendo investigada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal. Nesta segunda-feira, a procuradora-geral da República afirmou haver indícios de uma ‘ação orquestrada’ para incendiar pontos da floresta. […] A primeira notícia sobre ele foi publicada no dia 5 de agosto pelo jornal Folha do Progresso, da cidade paraense de Novo Progresso. A reportagem relatava uma conversa com uma liderança dos produtores rurais da cidade. Ele prometia promover incêndios florestais no dia 10. Dizia o texto, ‘(Os Produtores) querem o dia 10 de agosto para chamar atenção das autoridades. (...) Na região, o avanço da produção acontece sem apoio do governo. Precisamos mostrar para o presidente que queremos trabalhar e o único jeito é derrubando. Para formar e limpar nossas pastagens é com fogo’. Dados de satélite colhidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e compilados pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará mostram que, a partir de 10 de agosto, houve um aumento significativo nas queimadas em áreas de floresta. Esse crescimento ocorreu principalmente em reservas florestais das cidades de Novo Progresso, Altamira e São Félix do Xingu. No dia 10, Novo Progresso tinha 124 registros de focos de incêndio ativos, um aumento em 300% em relação ao dia anterior. Altamira registrou 154 focos de queimadas entre os dias 6 e 8 de agosto. Nos três dias seguintes, de 9 a 11 de agosto, havia 431 pontos de fogo na cidade. Ou seja, alta de 179% em três dias. São Félix do Xingu apresentou um aumento mais significativo: entre os dias 6 e 8 de agosto, o município registrou 67 focos. Nos três dias seguintes, foram 288 – aumento de 329% em três dias.” [fecha aspas]
Alguns dias depois do “Dia do Fogo”, a fumaça negra chegou a São Paulo, a mais de 2 mil quilômetros de distância de onde a queimada havia sido originada, e o dia se converteu em noite na maior cidade das Américas.
Durante a queima das películas fotográficas, eu percebi que minha impressão digital ficava impregnada na emulsão derretida, amalgamando a evidência e a identidade do perpetrador. Lembrei-me de Nina Berman, em uma profunda conversa que nós duas tivemos no ano passado sobre narrativas visuais que abordam temas de violência, injustiça e violações aos Direitos Humanos e da Natureza: "há de se mostrar o perpetrador e não só suas vítimas."
Em 2020, o Pantanal, uma das regiões de megadiversidade do planeta e a maior planície alagável do mundo, viveu uma temporada de incêndios sem precedentes, onde um terço de sua área foi transformada em cinzas e pelo menos 17 milhões de animais morreram queimados. Em uma dimensão geográfica e temporal, foi como se mais da metade da Suíça tivesse sido queimada em apenas nove meses. Naquele ano, mais de 90% dos focos de incêndio foram iniciados por ação humana e o ar extremamente seco, o vento forte, a dificuldade logística, a negligência e a consequente insuficiência em equipamento, água e pessoal criou o inferno, onde poucos brigadistas, veterinários e biólogos se desdobravam em um esforço sobre-humano e um número incontável de animais via-se encurralado, muitos sucumbindo às chamas. O que se passou no Pantanal naqueles meses foi digno de uma crônica apocalíptica: as chamas saltavam de um lugar para o outro e iniciavam-se assim, do nada, pois o terreno turfoso fazia com que muito do incêndio acontecesse no subsolo. Assim, ele era invisível aos olhos, porém sentido nas patas e pés que queimavam enquanto se tentava fugir de uma chama extensa, que feria, mas que se espalhava em uma direção que não se conseguia saber. Dessa maneira, animais e equipes de combate e resgate foram testemunhas e vítimas de um ecocídio. Nas fotografias e vídeos produzidos in loco, a linha de fogo e a fumaça eram tão extensas que parecia impossível extingui-las; animais agonizavam ou eram encontrados tardiamente, já carbonizados. Eram imagens difíceis de se olhar sem estarrecer-se. A despeito do horror que foi noticiado diariamente em todas as mídias em âmbito nacional e internacional e das análises que apontavam as causas e como tentar preveni-las, o cenário na região pantaneira conseguiu se repetir com ainda mais crueldade em 2021.
Pesquisando, eu encontrei publicado em 04 de setembro de 2020 no website do Governo do Mato Grosso: [abre aspas] “Laudos das perícias realizadas pelo Centro Integrado Multiagências de Coordenação Operacional, a Ciman-MT, apontam que os incêndios registrados na região do Pantanal mato-grossense foram provocados por ação humana. Os laudos foram encaminhados para a Delegacia de Meio Ambiente para que seja aberto inquérito e responsabilização dos infratores. […] Na Reserva Particular do Patrimônio Natural Sesc Pantanal – região de Barão de Melgaço, a causa do incêndio foi dada como queima intencional de vegetação desmatada para criação de área de pasto para gado em uma fazenda na região, que entrou para a área da reserva. A equipe fez o deslocamento com a aeronave da Força Aérea Brasileira e constatou o uso de madeiras, palanques de cerca e rodeios para o gado. Próximo a este local a equipe também encontrou galões de óleo diesel que aparentavam terem sido utilizados para incendiar as pilhas de material vegetal derrubado. […]” [fecha aspas]
“Era um domingo. Por volta das 19h30 de 2 de setembro de 2018 e, durante a madrugada da segunda-feira, dia 3, o Brasil viu uma parte da própria história queimar e se perder. A maior parte dos 20 milhões de itens que o Museu Nacional abrigava foi totalmente destruída. Nele, estava o mais antigo fóssil humano já encontrado no país, a Luzia; a coleção egípcia que começou a ser adquirida ainda por Dom Pedro I; a coleção de arte e artefatos greco-romanos da Imperatriz Teresa Cristina e coleções de paleontologia que incluíam o fóssil de um dinossauro proveniente de Minas Gerais. […] Pesquisadores, historiadores e funcionários do Museu foram até o local em busca de auxiliar na contenção do fogo. […] Quando o incêndio foi finalmente apagado, por volta das 3 horas da segunda, a equipe do Museu lamentou a destruição de 90% do acervo.”
O Correio Brasiliense, 02 de setembro de 2021. Título da matéria: “Incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, completa três anos: relembre”
Era um domingo. Eu passava despretensiosamente pela sala da minha casa, onde assistia-se ao noticiário noturno quando fui tomada pela imagem de chamas altas vistas de um helicóptero e uma fração da fala do repórter “o incêndio no Museu Nacional”. Atônita, parei para ver a reportagem (‘aquele fato chocante procedia?!’). Eu havia visitado o museu no final do ano e podia recordar o meu deslumbramento com o acervo e com a forma em que ele era organizado nas instalações para que o público pudesse conhecê-lo e, assim, conhecer nossa história: como planeta, como espécie, como civilização, como ser. O ruído das labaredas sobreposto ao do helicóptero que sobrevoava o local anunciava a destruição das nossas heranças biológicas, sociais e culturais que se passava ali. Pela TV, transmitia-se ao vivo as imagens de um fogo avassalador que eclodia através das janelas e teto de cada cômodo do casarão. Na minha mente, eu via a Luzia, a preguiça gigante, o tiranossauro: tudo em chamas, até ser reduzido a um pó fino que seria, na sequência, aniquilado de vez pelo vento. Quando o incêndio foi finalmente apagado, por volta das 3 horas da segunda, minhas memórias emudeceram.
“Um incêndio atingiu um galpão da Cinemateca Brasileira, em São Paulo. […] Nesse prédio, ficavam guardados 1 milhão de documentos da antiga Embrafilme, como roteiros, arquivos em papel, cópias de filmes e equipamentos antigos. Alguns tinham mais de 100 anos e seriam usados na montagem de um museu, para contar a história do cinema brasileiro. […] Em abril deste ano, os trabalhadores da Cinemateca fizeram um manifesto alertando para a situação de abandono da instituição e pediram esclarecimentos à Secretaria Nacional do Audiovisual sobre a efetivação do plano emergencial anunciado pelo secretário de Cultura Mário Frias, em dezembro de 2020. O ex-diretor da Cinemateca foi ao local assim que soube do incêndio e se emocionou: disse Carlos Magalhães ‘A memória do audiovisual brasileiro nesse estado. Desolação. Total desolação.
De pesar...’[…]”
Jornal Nacional, Rede Globo, 29 de julho de 2021. Título da matéria: “Incêndio atinge um dos galpões da Cinemateca Brasileira, em São Paulo”
“A casa de reza do povo Guarani Kaiowá foi queimada neste sábado, 2 de outubro, de forma criminosa, na Tekoha Guapo'y, município de Amambai, Mato Grosso do Sul. Elizeu Guarani, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil e da Assembléia Geral do povo Kaiowá e Guarani, denuncia: ‘Estamos tristes porque é nosso templo sagrado. Com muito sacrifício erguemos e agora num piscar de olho foi queimado’ .”
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, 03 de outubro de 2021, na rede social.
“Gente, volto aqui para pedir ajuda. A pistolagem está muito forte em Anapu e a movimentação dos grileiros de peso também. A comunidade do lote 96 está exposta, assim como os outros assentamentos de agricultores familiares. Apesar da determinação judicial, a polícia não está protegendo a comunidade do lote 96, que teve duas famílias reféns e duas casas incendiadas na semana passada. São 25 crianças e estão apavoradas. Uma delas disse, ao ver o pai sair hoje pela manhã: ‘Pai, não vai, porque vão queimar a nossa casa!’. […]”
Eliane Brum, 17 de maio de 2022, na rede social.
Com foco nos incêndios que acontecem dentro do território brasileiro, na sua maioria criminosos, FOGO ABERTO (ou ABRIR FOGO) incorpora a violência dos atos contra o patrimônio natural e cultural que têm ocorrido de maneira marcante na atualidade e expõe os danos provocados pelos mesmos. A obra se desenvolve a partir da relação miscível que a fotografia guarda com seu referente e também dos usos que têm sido feito da mesma como objeto de preservação da memória. O trabalho acontece da seguinte maneira: primeiramente, a autora realiza fotografias de áreas naturais de alta relevância para a conservação no Brasil com câmera analógica de médio formato. Em seguida, tais películas fotográficas reveladas são sistematicamente queimadas pela artista – reproduzindo-se, assim, no suporte que carrega a representação desse locais de grande valor imaterial, a agressão que lhes tem sido infligida através da ação do fogo. Após a queima, o material resultante é digitalizado, editado e colocado em diálogo com reflexões e situações que a artista vivencia no seu cotidiano em relação ao tema, embebendo as imagens do contexto maior onde estão inseridas. Assim, FOGO ABERTO (ou ABRIR FOGO) convida para um debate sobre questões socioambientais, históricas e políticas prementes.
ler mais
FOGO ABERTO (ou ABRIR FOGO) é o resultado das minhas reflexões como artista visual, pesquisadora e pensadora da imagem e como cidadã, frente à situação que vivenciamos na atualidade de perda acelerada e violenta do nosso patrimônio natural e cultural através da ação do fogo.
Estarrecidos, temos vivenciado, nestes últimos anos, momentos de angústia e indignação frente ao fogo que impiedosamente devora o Brasil, consumindo paisagens, vidas e a nossa própria identidade. As imagens e os números divulgados são tão alarmantes que têm gerado um estado de choque coletivo frente à gravidade da situação e à dimensão das perdas. Afinal, o que resta após a passagem desse fogo, que violenta a terra e a vida sobre ela, colocando em risco nosso patrimônio natural? O que sobrará para o futuro, para ser visto, reconhecido e relembrado? Esse fogo me faz refletir sobre a vulnerabilidade e a fragilidade das coisas: das coisas que são parte da nossa história e da nossa identidade (como indivíduos, como comunidade e como sociedade). E da importância em preservá-las.
Pensando no caráter indicial e icônico da fotografia, em sua relação miscível com seu referente, e também nos usos que têm sido feito dela como objeto de preservação da memória, desenvolvo esta obra. Meu método de trabalho consiste na realização de fotografias de paisagens naturais que executo utilizando câmera analógica de médio formato. Tais paisagens estão localizadas em áreas definidas como prioritárias para a conservação da biodiversidade no Brasil. Após a captura dessas imagens, realizo a queima deliberada dessas películas fotográficas, que “contêm” essas paisagens naturais por mim fotografadas, reproduzindo nas imagens fílmicas únicas os atos violentos de apagamento que têm acontecido ao longo da História onde o mesmo fogo-elemento elimina ambientes naturais e culturais. Na etapa seguinte, as imagens resultado dessas queimas são digitalizadas, editadas e colocadas em diálogo com experiências cotidianas que tenho em relação ao tema.
Apesar de ter como base imagens da natureza, este projeto não se limita a remeter somente à destruição do patrimônio natural, mas pretende evocar (por meio dessas paisagens naturais que sofrem a minha intervenção) o apagamento através da ação do fogo que acontece de forma mais ampla no Brasil e que envolve também o patrimônio histórico e cultural – tomemos como exemplo os incêndios do Museu Nacional, do Museu da Lingua Portuguesa e da Cinemateca Brasileira. Assim, FOGO ABERTO (ou ABRIR FOGO) tem a intenção de provocar o debate sobre estas questões que são socioambientais, históricas e políticas: questões essas que têm urgência em serem debatidas, em um movimento onde a sociedade exerça um papel de protagonista e não de espectador e cúmplice. Este trabalho também pretende contribuir com o fazer artístico e com a pesqusia em artes, notadamente no campo da experimentação e da fotografia expandida. Assim sendo, a interação com o público proposta aqui neste ambiente virtual tem o objetivo de contribuir para a reflexão crítica, para a democratização do conhecimento e do acesso à arte.
Nota: Alguns nomes e siglas foram omitidos dos textos originais das audiodescrições subjetivas para, respectivamente, evitar expor indivíduos e facilitar o fluxo da narração.
ESTE TRABALHO FOI CONTEMPLADO COM O XVI PRÊMIO FUNARTE MARC FERREZ DE FOTOGRAFIA
E CONTOU COM O APOIO DA ARTMOSPHERE FINE ART.
A toda a equipe do Parque Nacional da Serra do Cipó, Parque Estadual do Rio Doce, Parque Estadual do Sumidouro e Parque Estadual da Serra do Rola-Moça, em especial a Edward Elias Júnior, Vinícius Moreira, Bárbara Evellyn Vitor Calazans, Jailma Soares, Claudia Silene Nunes Pinto, Sebastião Leandro Pinto, Marlon Araújo de Souza, Romário Aparecido da Silva, Renato Lima Magalhães, Marcos Lima Francisco, Gabriel Coura Assis, Cintia Avelar Palhares, Rodrigo Teribele, Érika Aparecida de Oliveira, Elaine Pereira de Souza, José Geraldo Pereira Nogueira, Jair de Miranda Pinto, Evandro Pereira Nogueira; aos assistentes de campo Gabriela Souza, Daniel Guedes e Cyro Almeida; a Cristiane Kopp, pela locução; a Paulo Baptista, por acolher este trabalho ainda nos primeiros momentos da sua concepção; a Flávia Peluzzo, pelas trocas no desafio que foi a edição das imagens; a Rodrigo Zeferino, pelos diálogos para o campo no PERD; a Cyro Almeida, pela presença e colaboração inestimável em diversos momentos e por gentilmente permitir que suas câmeras analógicas estivessem junto comigo em todas estas paisagens; a Julio Molina, pela grande parceria e afeto neste e em tantos outros processos da vida; a Alessandra Rosso e Luis Rodrigo Cerqueira, pelos momentos de elevação da alma, antes, durante e depois da edição; ao PrevFogo, brigadistas e voluntários do resgate e combate aos incêndios, pelo empenho, dedicação e compromisso com a vida.
Título da obra: Fogo Aberto (ou Abrir Fogo)
Autor: Marilene Ribeiro
Fotografias e intervenção: Marilene Ribeiro
Textos: Marilene Ribeiro + fontes diversas*
Comentários: Sue Branford, Marcela Bonfim e Marcelo Salazar
Assistentes de campo: Gabriela Souza, Daniel Guedes e Cyro Almeida
Revelação: Pedro Cine Foto e Super Camera
Digitalização: Artmosphere Fine Art
Tradução: Rachel Ann Hauser Davis
Locução: Cristiane Kopp e Marilene Ribeiro
Design gráfico: Luciana DElboux
Web design: Christiano Amaral
Realização: Funarte
Saiba mais sobre a autora
Referências
"Esta é uma exposição extremamente potente e inovadora. Nela, Marilene usa deliberadamente o fogo como arma para desfigurar as fotos que ela mesma fez de fenômenos naturais extremamente belos: como os primeiros momentos da alvorada em uma lagoa, com todas suas cores inesperadas e sutis que perfuram o quase breu da noite. As fotos desfiguradas são perturbadoras; porém, paradoxalmente sedutoras. Para aqueles que viram incêndios florestais na Amazônia provocados pelos vorazes ladrões de terras, as semelhanças são desconcertantes. Ambos mostram a terrível destrutividade do fogo, sobretudo quando está fora de controle. Mas, também há a sua encantadora beleza. Neste ponto, este trabalho de Ribeiro me remete ao mito Yanomami da criação do fogo, onde os Sanema-Yanomami enganaram Iwá, o jacaré dono do fogo, que escondia o fogo dentro da sua boca. Eles contaram-lhe uma piada tão ridícula que ele não pôde deixar de gargalhar e, sem querer, terminou abrindo a boca, permitindo que um Yanomami roubasse o fogo. Mas, o fogo mostrou-se difícil de controlar – a esposa do jacaré tentou apagá-lo, urinando nele, mas não obteve êxito. O fogo se escondeu no coração da árvore sagrada Pulo e, a partir daí, os Yanomami só poderiam ter acesso a ele aproximando-se com todo o respeito da árvore, devido a esse ser um objeto sagrado.
Com refinamento, FOGO ABERTO (ou ABRIR FOGO) alerta para o perigo do uso indiscriminado do fogo, sem o cuidado demonstrado pelos Yanomami. O próprio título faz referência à investida dos grileiros e criadores de gado nas florestas brasileiras e ao seu modo de uso do fogo segundo seus interesses. Eles não o utilizam com cautela, como forma de domesticar as plantas e combinar harmoniosamente a necessidade dos habitantes da floresta por pequenos trechos de mata derrubada, com o respeito pela floresta de que necessitam para sua sobrevivência. Ao invés disso, aplicam-no como uma arma de destruição, fora de controle, acarretando enormes danos aos sistemas naturais, aos seres locais e, muitas vezes, aos próprios incendiários. Desta maneira, a exposição FOGO ABERTO (ou ABRIR FOGO) apresenta-se como uma reflexão sobre o processo global de ocupação violenta e gananciosa do mundo natural por forasteiros, ansiosos apenas pelo dinheiro e ao custo da devastação. E é isso que está tornando este planeta inabitável ."
(Sue Branford – jornalista, Mongabay, Latin America Bureau e ex-editora da BBC)
"Entre planos acesos e apagados, coexistem tempos e espaços por onde buscamos de forma mais consciente, absorver o campo sensível da fotografia. Planos que também se abrem da queima de um ”Fogo Aberto”, inclusive, alimentando lugares onde aparentemente só se vê a destruição. Esta, uma relação estreita com o estado infinito das composições, onde decompor é a própria natureza de nossas trajetórias. Como também de um filme, que por sua vez, revela o percurso do ar, como também da combustão e da decomposição do tempo; onde perceber esses movimentos é prová-lo de si, para si; oferecendo também aos possíveis destinos, como a política, a ecologia, a identidade, e as humanidades. Camadas refletidas neste banquete visual de sentidos e trajetórias, experimentado e oferecido por Marilene Ribeiro, ao se alimentar da própria natureza como reflexo de questões que já modificam o mundo; aqui abertas em decomposição de um tempo-espaço que já é futuro."
(Marcela Bonfim – fotógrafa, pensadora visual)
* Referências utilizadas nos textos das audiodescrições subjetivas:
As audiodescrições desta exposição seguem as normas do Centro Tecnológico de Acessibilidade
e da Fundação Dorina Nowill para Cegos.